sábado, junho 28, 2014 

Jovens universitários, duas histórias exemplares




É inteligente e poderia ser excelente aluno! O jovem, alto, de cabelo revolto, olhar vivo, a quem chamarei Manuel - , espera que os seus colegas saiam da sala de aula. Aproxima-se de mim e diz-me “ estou farto, professora!” Explica-me em voz em voz baixa, num tom  cansado, fugindo de me olhar a direito talvez  porque sabia que a força das suas palavras me ia deixar incomodada e envergonhada.
- Estou cansado! Eu sou de um distrito. Estou em casa de familiares. Agora, vou para casa agora, vou cozinhar, lavo a loiça, arrumo a cozinha, passo a ferro, limpo a casa e, quando dou por isso, é noite. Então, ou já estou demasiado cansado ou falta a luz e não estudo!

Marco, de seu nome fictício, sabe que pode ir mais longe e é o que me diz num discurso curto e directo:
- Eu sei que podia ter melhores notas. Não consigo porque, em casa não tenho condições para estudar. Vivo em casa de uma irmã. Vim  de um distrito.

Em Timor-Leste fala-se muito de direitos. Direitos das mulheres, das crianças e dos mais velhos - em particular quando são veteranos ou viúvas de  guerrilheiros. Até de direitos dos ex-titulares. Há, pelo meio, uma classe etária que está no limbo, esquecida. Deles se diz volta e meia que são os construtores do novo Timor. Por isso se aposta no Ensino e na Educação. Uma aposta  que peca pela pouca importância  dada aos jovens.
Pergunto-me muitas vezes, quando me deparo com histórias como estas de que serve falarmos tanto do Ensino, da Educação, dos futuros “líderes da Nação” se não trabalhamos na totalidade dos aspectos importantes para que eles, os jovens, os tais futuros “líderes da Nação” tenham condições de vida razoáveis que lhes permitam fazer o que deles se exige que é  estudar?
Os  jovens provindos dos distritos deviam ter condições de vida razoáveis que lhes permitissem estudar. Mas não. São pequenos escravos em casa de familiares que usa e abusa do facto de os ter acolhido em suas casas.
É verdade que podem estar o dia todo na Universidade e ficar a estudar na Biblioteca. Mas eles, esses jovens dos distrito –  Não lhes deve ser fácil viver longe dos seus familiares e do seus ambiente! - , também  têm direito a querer estar em casa, comer em casa, estudar em casa,  para além do direito a gozar de merecido descanso em casa.
É verdade que a família em Díli lhes dá casa. Mas será isso razão para lhes exigir que trabalhem tanto?
E o Estado de Timor-Leste que precisa deles para a construção e a consolidação da Nação vai continuar distraído?